Mapeamento feito em 2021 pela Anatel e BID reforça as vantagens no aumento da conectividade.
Com um investimento em banda larga fixa de qualidade equivalente a 0,2% de seu orçamento anual, o Brasil poderá retomar seu crescimento econômico em médio prazo. É o que aponta um mapeamento feito em 2021 pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), no projeto Crowdsourcing for Digital Connectivity in Brazil (Projeto C2DB).
O mapeamento indica que, com 9,5 bilhões de dólares (cerca de R$ 47,5 bilhões) investidos num período de cinco anos, será possível levar conectividade a 15,8 milhões de pessoas que hoje não têm acesso a banda larga fixa ou móvel no país, além de 3.771 unidades de saúde e 21.230 escolas públicas. Isto resultaria num aumento de 2,4% no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro – algo equivalente a 38,59 bilhões de dólares (cerca de R$ 193 bilhões).
Em resumo: inclusão digital não é gasto; é investimento com retorno garantido. Quanto mais pessoas tiverem acesso às tecnologias de informação e comunicação, maiores serão as possibilidades de geração de oportunidades e desenvolvimento socioeconômico.
A necessidade de ampliar a conectividade, que já era evidente, ficou ainda mais clara com a Covid-19. Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), 495 milhões de postos de trabalho foram fechados em todo o mundo somente na primeira fase da pandemia, quando grande parte das atividades presenciais foram suspensas.
Neste isolamento forçado, empresas e consumidores viram no online um meio vital para sobreviver e até ampliar seus negócios. E tudo indica que este é um caminho sem volta. Especialistas consideram que o âmbito digital não será apenas responsável pela retomada dos empregos, mas já representa uma nova ordem na economia mundial.
O papel das redes comunitárias
Um caminho importante para a universalização da internet no país passa pelas redes comunitárias. Formadas através de organizações sociais coletivas, institucionalizadas ou não, elas permitem que grupos de pessoas num determinado bairro ou localidade desenvolvam uma estrutura de acesso de qualidade voltada para o bem comum, sem fins lucrativos e com custos acessíveis. Essas redes já beneficiam periferias e comunidades rurais onde os operadores comerciais não conseguem atuar por falta de viabilidade financeira ou interesse econômico.
– As redes comunitárias permitem que uma população antes infoexcluída tenha acesso a diversas possibilidades, como acesso a informação e canais de diálogo com o poder público, transações financeiras online, educação a distância, e-commerce e desenvolvimento de negócios locais – observa Marcelo Saldanha, presidente do Instituto Bem-Estar Brasil (IBEBrasil). Fundada em 2008, a entidade sem fins lucrativos desenvolve programas e projetos inovadores e autossustentáveis na área de tecnologia da informação e comunicação, buscando universalizar o acesso à internet como um direito humano fundamental.
Uma experiência bem-sucedida está em Marrecas, no norte do estado do Rio de Janeiro. Distante 40 quilômetros da cidade de Campos dos Goytacazes, a localidade – onde predomina a agricultura familiar – não contava com serviço de internet. Em 2010, a instalação de um provedor comunitário começou a mudar esta realidade. Hoje, cerca de 160 residências estão conectadas à rede mundial de computadores. O sinal chega via rádio, mas o IBEBbrasil trabalha junto a diversos parceiros para viabilizar a instalação de fibra óptica.
Os próprios moradores fazem a gestão do sistema, através de uma associação. Cada usuário contribui com uma taxa mensal entre R$ 20 e R$ 50, dependendo das regras estabelecidas pela associação. Neste processo, também são gerados empregos diretos: a instalação de equipamentos e manutenção da rede são feitas por técnicos capacitados na própria comunidade.
Expansão de rede de fibra óptica
Com a implantação de redes de fibra óptica, os moradores de Marrecas e de muitas outras localidades do Brasil poderão ter acesso a um serviço com capacidade maior de tráfego. Ao lado de outras instituições que trabalham pela universalização da internet no país, o IBEBrasil vem participando de diversas reuniões com representantes da Anatel para criar condições mais favoráveis às redes comunitárias – tanto do ponto de vista legal quanto econômico.
Uma das questões debatidas é a possibilidade de utilizar os Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) e as chamadas “obrigações de fazer” para acelerar a expansão da rede de internet de alta capacidade (backhaul), possibilitando que a fibra óptica chegue a localidades de grande interesse social. Com uma frequência cada vez maior, a Agência Nacional de Telecomunicações tem optado por estas sanções alternativas em substituição às multas aplicadas às operadoras reguladas.
Desafios legais
Do ponto de vista legal, houve diversos avanços nos últimos anos. Em 2017, após a aprovação da Resolução 680, a Anatel mudou o Marco Regulatório, permitindo que qualquer cidadão, associação ou empresa de pequeno porte possa prover o acesso à internet de forma desburocratizada e com dispensa de autorização, bastando somente um cadastro prévio na agência. O debate trouxe outras conquistas importantes, como a redução no preço da autorização do serviço e o direito de uso de radiofrequência.
Agora o IBEBrasil propõe que a agência descriminalize as redes comunitárias em situação irregular ou não autorizada, reduzindo as sanções administrativas e penais que pesam sobre elas até que consigam regularizar sua situação. A intenção é criar um ambiente regulatório mais seguro e favorável.
Pela atual regulamentação da Anatel, redes comunitárias e pequenos provedores que não tenham outorga de serviço de telecomunicações ou uso autorizado de radiofrequências podem ser multados em até R$ 10 mil. A proposta é que as redes comunitárias sejam isentas dessa multa em primeira incidência. Neste caso, as sanções se limitariam a uma advertência, com interrupção temporária do serviço, até que ele seja regularizado. A multa só seria aplicada em caso de reincidência e com valor máximo de R$ 500.