O acesso à informação é direito positivado e advém da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu Artigo 19, que diz:
“Artigo 19
Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.”
Em nossa Constituição Federal, no artigo 5º, residem os seguintes incisos:
“IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;”
Estes direitos, inalienáveis, fundamentais, são traduzidos em outras declarações, como a Declaração de Princípios da Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação, em 12 de Dezembro de 2003, sendo uma das primeiras a destacar a importância da universalização do acesso às TIC como direito, onde destacamos os seguintes artigos:
“4. Reafirmamos, como fundamento essencial da Sociedade da Informação, e conforme delineado no Artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; que esse direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de buscar, receber e transmitir informações e ideias por qualquer meio e independentemente de fronteiras. A comunicação é um processo social fundamental, uma necessidade humana básica e a base de toda organização social. É fundamental para a Sociedade da Informação. Todos, em todos os lugares, devem ter a oportunidade de participar e ninguém deve ser excluído dos benefícios que a Sociedade da Informação oferece.
21. A conectividade é um agente facilitador central na construção da Sociedade da Informação. O acesso universal, ubíquo, equitativo e acessível a infraestruturas e serviços de TIC constitui um dos desafios da Sociedade da Informação e deve ser um objetivo de todas as partes interessadas envolvidas na sua construção. A conectividade envolve também o acesso à energia e aos serviços postais, que devem ser assegurados de acordo com a legislação nacional de cada país.
23. As políticas que criam um clima favorável para a estabilidade, previsibilidade e concorrência leal em todos os níveis devem ser desenvolvidas e implementadas de uma forma que não apenas atraia mais investimento privado para o desenvolvimento da infraestrutura de TIC, mas também permita que as obrigações de serviço universal sejam cumpridas em áreas onde as condições tradicionais de mercado deixar de funcionar. Em áreas desfavorecidas, o estabelecimento de pontos de acesso público às TIC em locais como correios, escolas, bibliotecas e arquivos pode fornecer meios eficazes para garantir o acesso universal à infraestrutura e aos serviços da Sociedade da Informação.”
Feito estes destaques do contexto histórico da relevância de universalização do acesso como direito fundamental, vejamos, aqui no Brasil, o que foi proposto e dai temos como primeiro caso de incidência política a PEC 479/2010. Nos Debrucemos sobre esta PEC, que de fato foi a que mais teve mobilização social em torno do tema, pois, na mesma época havia território fértil para se debater novas formas de participação democrática e social e que foi fortalecida em seguida, em 2011, pela definição da ONU de que o acesso à internet era um habilitador para a garantia de outros direitos humanos.
A PEC 479/2010, teve como autor o Deputado Federal Sebastião Bala Rocha, do PDT/AP e como relator o Deputado Amauri Teixeira PT/BA. Ao olhar para a tramitação, dá pra perceber que ela veio antes de haver um clamor maior pelo serviço, apesar de naquela época o acesso à internet já ser uma demanda na sociedade. É plausível também que esta PEC tenha vindo de encontro com os debates globais oriundos dos vários movimentos sociais em relação a democracia e acesso à informação e como a internet estava entrelaçada com estes movimentos, como no caso da primavera árabe e no caso do Brasil, os movimentos de participação social e logo em seguida os de combate a corrupção.
De certo o debate somente esquentou a partir do #J13, ou seja, a “agenda positiva” proposta pelo Congresso Nacional frente às manifestações ocorridas no país. Com isso a PEC entrou em pauta e aproveitando o momento o Instituto propôs o debate online sobre a PEC, incluindo o tema na plataforma E-Democracia da Câmara dos Deputados, através do requerimento feito pelo Deputado Miro Teixeira e além do espaço virtual onde se debateu o tema, uma enquete também foi lançada e audiência públicas realizadas em vários estados brasileiros.
O parecer do relator, ao final de todos os debates, era positivo e que estava claro o clamor para a inclusão do acesso à internet como direito fundamental no Artigo 5º da Constituição, porém, mesmo com este clamor, o lobby e interesses políticos contrários colocaram a PEC 479 pra dormir, morrendo em definitivo no ano de 2015.
Em paralelo à referida PEC, outra foi proposta e acredito que tenha sido uma estratégia para de fato enterrar o tema do Artigo 5º e acabaram propondo a PEC 06/2011 para incluir o acesso como direito social, no Artigo 6º. A nosso ver foi mais uma estratégia de enfraquecer e enterrar a 479 do que outra coisa. Em 2018 a PEC 06/2011 foi arquivada.
Esta saga é tão interessante porque em nenhum momento, desde o WSIS 2003, a internet deixou em algum momento de ser relevante, pelo contrário, a cada dia que se passava o tema do fosso digital era cada vez mais pautado, tanto que a ONU em 2016, reforçou o papel da internet, agora, como de fato um direito humano.
Então o que aconteceu depois deste caminho trilhado? Respondo: Temos mais 3 PECs tramitando, sendo elas: PEC 185/2015, PEC 08/2020 e PEC 35/2020.
E ai? Vamos nos mobilizar pra cravar de vez o acesso à internet como Direito Todos e Todas? O IBEBrasil é uma organização social sem fins lucrativos que atua em incidência política e regulatória na busca da universalização do acesso à internet como direito fundamental.